Guaibadas é uma homenagem a Porto Alegre e o rio/lago que o circunda, cidade em que se passa a maioria das histórias que vou contar aqui. Histórias que aconteceram comigo, com amigos e amigas, com conhecidos e desconhecidos. Alguns causos são hilários, outros apenas divertidos, muitos são tristes, outros não tem nada de especial, mas mesmo assim devem ganhar a luz do dia. Enfim, um olhar sobre o porto-alegrense e suas loucuras.
quinta-feira, 30 de abril de 2015
“Calote”
Recém-formado e desempregado, o jeito era à época, idos de 1991, pegar os classificados dominicais e procurar ofertas de emprego. Na segunda-feira ir ao correio e enviar o currículo, quase nulo, já que a experiência praticamente era zero, para as empresas que colocavam seus anúncios, procurando jornalistas. Até que um dia apareceu uma resposta de uma revista que estava sendo lançada no sul do país. Vibrei e fui na entrevista, cuja vaga era para repórter da “Revista do Nativismo”. Eu, roqueiro e sem nenhum gosto pelo assunto, aceitei por desespero. Tinha de passar os dias visitando CTG’s, conversando e entrevistando patrões, prendas. Em suma, um saco. A revista tinha sede perto da UFRGS, na rua Avaí. Passou um mês e nada de salário, dois meses e nada de salário, três meses e nada, nada, nenhum centavo, mas os donos da revista dizendo que logo os anunciantes fariam os pagamentos e eu receberia meu dindim, acumulado. E dê-lhe passar os finais de semana escutando as pessoas dizendo que rock era coisa de débil mental, que mulher deveria ficar na cozinha e que não deveria usar calça comprida, entre outras bobagens. Pois começou o quarto mês, saio de casa e me dirijo para a redação. Na entrada, o zelador do prédio me vê, e pergunta: “Guri, onde tu vai?”. “Ué, na revista”. Aí escuto o absurdo: “Rapaz, os donos vieram ontem aqui, e esvaziaram tudo. Não ficou nada”. “Mas como?”. “Ora, eles fecharam a revista”. Putaqueopariu, penso, me sentindo o maior trouxa. Na época não existiam celulares e os telefones que tenho não são atendidos. Então descubro que um dos donos também trabalhava na rádio Liberdade, que ficava na Protásio Alves. Me mandei para lá, tomei um chá de cadeira, até achar o pilantra. Ele me viu, arregalou os olhos e tentou sair por outra porta. Fui atrás. “Cara, minha grana”, berrei. Ele teve de parar e me encarar, já pedindo desculpas. “Puxa, não conseguimos os anunciantes necessários”, foi dizendo. “Não me interessa, trabalhei três meses e quero minha grana, inclusive as passagens que gastei”, falei, nem acreditando ter tido coragem. O cara me pediu uns dias para levantar o dinheiro e me pagar. Acreditei e levei mais três meses para receber. Toda a semana era a mesma desculpa, até que ele me passou três cheques pré-datados, que claro estavam sem fundos. O jeito era ligar para o trabalho e até para a casa dele, e falar com a mulher dele, que no mínimo se encheu das minhas ligações a qualquer hora do dia, feitas de orelhão, e deve ter pedido para ele pagar aquele cara chato que não parava de ligar. Dez anos depois, tomei outro tufo em um frila, mas esta história fica para outro dia.
terça-feira, 28 de abril de 2015
“No Escurinho do Cinema”
Ninguém tem paciência comigo, parafraseando o Chaves. Véspera de feriado de Tiradentes e decido ir ao cinema, lá no Espaço Itaú, no Bourbon Country. Chego e a fila para comprar os ingressos é enorme, uma piazada berrando e correndo. Torço para que não seja na sessão que pretendo ver, mas não, pois iria assistir a comédia-romântica “Um Fim de Semana em Paris”, e a criançada estava lá para ver “Cada Um Na Sua Casa”. Pego o meu ingresso e como ainda tem uns 30 minutos para começar o filme, vou dar uma volta na Livraria Cultura. Erro, pois acabo encontrando amigos e conhecidos e papo vai, papo vem, acabo me atrasando para entrar na sala 8. E quando o faço. o cinema está lotado. Como os lugares são marcados, vou na minha fila e ao chegar na minha poltrona, tem uma senhora sentada nela. A do lado está vazia. Bem, não vou brigar por um lugar. Aí peço com licença e ao passar pela senhorinha, acabo pisando no pé dela, já que o espaço para caminhar é mínimo. Levanto as mãos e peço desculpas, mas não adianta. Ela começa a berrar, me xingar: “Seu idiota, pisou no meu pé, imbecil, tu não enxerga”. “Minha senhora, me desculpe, foi sem querer”, digo. “Idiota, idiota, você fez por gosto”, berra a mulher dentro da sala. Eu quero que um buraco abra e eu possa entrar nele. E ela berrando. Eu sento na poltrona livre, ao lado dela. E a mulher me olha com uma raiva inacreditável e diz: “Do teu lado eu não fico, imbecil”, grita e levantando, trocando de lugar com um senhor que estava em outra poltrona. Deu, ali a sessão de cinema foi pro espaço pra mim. Passei as quase duas horas, encolhido, não achando graça de nada, por causa de uma atitude destemperada de uma pessoa, que além de tudo, estava sentada em meu lugar. Não sei o quanto teve de intolerância, racismo e outras coisas mais ali.
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