Guaibadas é uma homenagem a Porto Alegre e o rio/lago que o circunda, cidade em que se passa a maioria das histórias que vou contar aqui. Histórias que aconteceram comigo, com amigos e amigas, com conhecidos e desconhecidos. Alguns causos são hilários, outros apenas divertidos, muitos são tristes, outros não tem nada de especial, mas mesmo assim devem ganhar a luz do dia. Enfim, um olhar sobre o porto-alegrense e suas loucuras.
quarta-feira, 17 de julho de 2013
“Malvinas ou Falklands”
Quando digo que sou tímido, as pessoas começam a rir quase freneticamente, além de duvidar de minha afirmação. “Tá bom Chico, tu é tímido, sei...”, costumo escutar, principalmente das mulheres, em tom irônico. Eu comecei a oitava série quieto, muito quieto, sempre com um livro embaixo do braço. Muitas vezes nem saia para o recreio. Ficava lá, sentado, lendo alguma coisa. No começo do ano, naquelas perguntas dos professores para conhecer os alunos, eles perguntavam: “Qual a profissão que você pretende seguir?”. Eu respondia sempre Jornalismo, e voltava para a minha concha. Então inicia a Guerra das Malvinas, eu comprava os jornais todos os dias para acompanhar o desenrolar do conflito. Correio do Povo, Folha da Tarde, Zero Hora, a Veja. Fiz uma pasta com os recortes, e ficava lá nas aulas, lendo sobre a guerra, ao lado de livros sobre a II Guerra, a Revolução Russa e a Revolução Francesa. Aí chega a professora de História, Bela Igór, e sai perguntando a cada aluno o que ele achava da Guerra das Malvinas e quem estava certo? A Inglaterra ou a Argentina. E vem chegando a minha vez de responder, mas não quero. Suo frio. “Francisco, qual a tua posição sobre o conflito?”. Eu não quero responder, não quero expor minha preferência pelos ingleses, ainda mais que muitos colegas, pela proximidade, por vivermos numa Ditadura, achavam que os hermanos é que deveriam dominar o arquipélago. “Não quero falar”, digo, decidido, depois de balançar a cabeça, desesperado. “Mas tu tens de falar”, ordena a professora. “Não”, insisto. “Tu queres ser jornalista, e não fala, não quer dar tua opinião? Jornalista tem de falar”, provoca ela. Mantenho-me calado. Não levo zero porque não vale nota. Mas ela se dirige à minha classe, pega meus livros. “Estás lendo sobre a Revolução Francesa?”, pergunta Bela Igór, com um sotaque estranho, que depois descubro ser húngaro. “Sim”. “Então tens uma missão para daqui a uma semana”. Arregalo os olhos por trás das lentes grossas do óculos. “Dará uma aula sobre a Queda da Bastilha para teus colegas, 15, 20 minutos. Valerá metade da tua nota no bimestre”, avisa. Me fudi. Falar em público? Na semana seguinte, me borro todo, mas consigo falar sobre 1792, mesmo que metade das palavras sejam engolidas pela minha gagueira, meu pânico, minha péssima dicção. O problema é que a professora Bela Igór abriu o cofre. Começo a falar sem parar, passo a bagunçar, e mesmo ainda dono de uma forte timidez, consigo esquecer que ela existe.
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