quarta-feira, 5 de junho de 2013

“Judeu”

Na quinta série, lá no Paula Soares, eu tinha um colega que nunca aparecia no colégio aos sábados pela manhã, e era dispensado das aulas de religião. Eu não entendia porque o Victor Hugo tinha aquele privilégio, e ao lado de meus outros colegas “azarados”, imaginávamos que o guri ficava num clube jogando botão ou ping-pong ou jogando bola. Morríamos de inveja. Que acabaria de modo brusco. Dias depois da Páscoa, escutamos uma gritaria no corredor, e fomos todos para lá. O Victor Hugo, que era meio franzino, estava sendo surrado por uns caras mais velhos. Ele tomava um sopapo, caia, tentava levantar, levava uma rasteira, caia de novo. Uma colega, Cristina Mocellin, tentou apartar. “Parem, parem, ele não fez nada para vocês”, disse, colocando-se no meio do bolo. “Sai, sai”, ameaçou um dos grandões. “Eu não fiz nada”, disse o Victor Hugo. Até hoje escuto a resposta de um dos espancadores. “Tu é judeu. Tua raça matou Jesus Cristo”, e vapt-vupt, mais uma porrada no Victor Hugo. “O quê? O quê? Como assim?”, perguntou outro colega. “Ele é judeu”, e vapt-vupt. E eu sem entender o que era aquele negócio de judeu. Em casa perguntei pro pai sobre judeus, morte de Jesus Cristo. Ah, tá...mas o que o Victor Hugo tinha a ver com tudo aquilo? Bem, nem ele entendia, e volta e meia era espancado nos corredores, no pátio. O guri só terminou com o bullying nazista quando começou a fazer karatê. Um dia, quando tomou a rasteira, levantou rápido e deu uma surra num daqueles skinheads mirins. No final do ano, ele saiu da escola, e nunca mais o vi.

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