domingo, 16 de junho de 2013

“Teimosia”

O Newton Azambuja era um repórter da Rádio Guaíba que andava sempre de terno e gravata, modelos 1970. Gremista e vascaíno, devido a sua longa experiência, não aceitava opiniões contrárias. Uma vez, estávamos na salinha do esporte, o Grêmio iria jogar com o Vasco, e enquanto nos organizávamos, ele ia contando os jogos que havia feito entre os dois anteriormente. “Recordo de 1984, pelo Campeonato Brasileiro, no Maracanã, nas semifinais, a partida finalizou com o placar em branco”, garantiu ele com a voz empostada. Eu estava redigindo o roteiro, paro de digitar, e corrijo: “Não, Azambuja, o jogo terminou em 3 a 0 para o Vasco”. “Não, 0 a 0, eu estava lá atrás da goleira”. “Não, foi 3 a 0”. “Chico, foi empate. Me lembro como fosse hoje”. “Bom, então tu dormiu e não viu os gols do Vasco”. “Tu não sabe nada, tu é guri, tu é cagalhão”, dispara o Azambuja. “Posso ser, mas minha memória é foda, e vi o jogo pela tevê. Foi 3 a 0 pro Vasco”, teimo. “Tu não sabe nada, tu não sabe nada”, encerra ele, e a galera cai na risada. Era pré-google, tenho de esperar ir pra casa, pegar minha coleção de Placar, procurar o tal jogo, separar a revista, e esperar o dia seguinte. O Azambuja chega na redação com sua pasta 007, e senta. “E aí Azamba”, provoco. “Azambuja. Newton Azambuja”. “Tudo bem. Então, reviu o jogo?”, pergunto. “Tu vais insistir com isso?”. “Sim, tu está errado”. “Errado estás tu, eu estava lá”. Pego a revista, mostro a matéria do jogo, mostro o Tabelão com os dados. E...o Azambuja insiste. “Está errado, eu estava lá”. “Azambuja, está registrado na revista, notou, está aqui a matéria, é algo concreto...”. “Está errado”, diz ele pela milésima vez. Eu largo a Placar, chego perto dele, fecho a mão e bato de leve na testa dela, como se estivesse batendo numa porta. “Alô, alô, alguém em casa? Não, não tem ninguém...” Na mesma hora, o Azambuja pula de trás da mesa, e tenta me pegar pelo pescoço, mas consigo me desviar e saio porta afora, me mijando de rir.

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