sexta-feira, 7 de junho de 2013

“Pirralha”

A Catia era uma gatinha que eu conheci ainda pirralha, brincando de boneca. E ela cresceu muito bem, virou um mulherão, sensual, provocante. Os caras se dobravam à passagem dela, mas para mim nada mais distante, quase como se fosse um crime maior, quase pedofilia. Ficamos tri amigos, conheci uns namorados dela, ela me confidenciava sua vida amorosa, e a gente dava risada das tragédias românticas um do outro. Mas a guria não parava de crescer...e ao ultrapassar idade em que não teria muita diferença para a minha, comecei a vê-la com olhos famintos, e a Catia notou que as minhas brincadeiras começaram a ficar mais pesadas, desrespeitosas mesmo. E ela foi logo cortando minhas asinhas, afinal eu era como um irmão mais velho. “Tá bom, não brinco mais, não falo mais nada”, prometi. Segurei o tesão até o dia em que ela me ligou, havia brigado com o namorado, e queria desanuviar. Pegar um cinema, tomar uns chopps. Ok, vamos nessa, disse. Fomos ao Moinhos, vimos um filme, eu sentindo o perfume delicioso dela, a respiração ofegante, o decote generoso mostrando os seios grandes. E pensava, se segura, senhor Francisco de Assis. Depois da sessão, ela chorou as mágoas em relação ao ex-namorado, enquanto iamos tomando um, dois, três chopps...seis, sete canecas e a tonteira pegou, e ela ensaiou um choro. “Só tu é meu amigo, só em ti eu confio”, disse ela, com a voz enrolada. “Tá, vamos embora, que tá tarde. Te levo em casa”, digo. Pegamos um táxi, e a guria cai no sono, a cabeça no meu ombro. O táxi vai seguindo seu caminho, e a Catia acorda, passa a mão direita no meu rosto, e ao me encarar, abre um sorriso. Na mesma hora, meu instinto animal vem à tona, e eu a agarro. Só que li mal os sinais. Ela só queria um carinho amigo, e fica muito puta comigo. Me dá um safanão e berra NÃO. O taxista continua seu trabalho, nem olha pra trás, acostumado que está com casais se agarrando. E não era o caso. Envergonhado, eu me afasto, e fico num cantinho, quase encolhido. A Catia fecha a cara. Chegamos em frente ao prédio dela, e descemos. Pago a corrida. E a Catia séria. Ela abre a porta, e aí sim me olha bem nos olhos. “Filho duma puta, filho duma puta. Não dá mesmo pra confiar em homem nenhum. FILHO DA PUTAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA. Chico, tu é foda, não quero mais te ver”. “Mas Catia”. “Some, some. FILHO DUMA PUTAAAAA”, berra mais uma vez, entrando no prédio, sem olhar pra trás. Dois dias depois, toca meu telefone. Vejo o número, e é a Catia. Ah, passou a raiva, imagino, e atendo, todo feliz. E do outro lado da linha. “Tu é um FILHO DA PUTAAAAAAAAA”, grita a Catia, desligando em seguida.

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