sexta-feira, 3 de maio de 2013

Cenoura

Minha linda tia Vani, gaúcha de Livramento, fazia um bolo de chocolate maravilhoso para mim quando eu a visitava, lá nos meus 7, 8 anos de idade. Eu chegava na casa dela, sentava na sala, ficava vendo tevê e lendo alguma revistinha em quadrinhos. Então a tia Vani ia para a cozinha e voltava com aquele bolo fumegante, e um copão de Toddy, e ficava fazendo cafuné na minha cabeleira black-power, enquanto eu devorava o quitute. Não é que um dia eu chego lá na casa dela e vou direto na cozinha, onde vejo ela ralando uma cenoura. “Tia, o que tu tá fazendo?”. “Ora, Chiquinho, teu bolo”. “Mas por que a cenoura?”. A tia Vani me olha surpresa, e fala tranquilamente: “Porque sim”. “Mas tia, eu não gosto de cenoura”. “Guri, tu sempre comeu o bolo e nunca reclamou”. “Mas ele não tinha cenoura”, respondo. “O bolo sempre levou cenoura”. “Bom, então não quero mais”, retruco, indo para a sala para ver algum desenho na televisão. A tia Vani, quieta lá na cozinha, até que aparece com a fatia do bolo e o meu copo de achocolatado. “Tia, eu não quero o bolo”, teimo. “Tu sempre gostou dele”, diz ela, me oferecendo o lanche, que ponho de lado. A tia Vani não falou nada, simplesmente voltou para a cozinha, pegou o resto do bolo, voltou pra sala, e disse: “Agora tu vai comer todo ele”. Faço beiço, e é um erro. Ela segura minhas bochechas, me faz abrir a boca, e me empurra todo o bolo goela abaixo, pedaço por pedaço. Choro, esperneio, e ela não sossega enquanto não dou a última mordida, para nunca mais comer bolo de cenoura na vida. “Viu, bobalhão, o gosto é o mesmo. Tu só não quer porque viu eu fazendo, descobriu os ingredientes”. E nunca mais ganhei bolo da tia Vani.

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